Mesa de Bar

Lugar pra se falar sobre tudo e sobre o nada.

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Local: Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil

Sóbria, a maior parte do tempo. Na mesa de um bar me torno mais corajosa, mais sensível, mais emotiva, mais generosa. No bar e com umas cervejas a mais, as dúvidas se dissipam, as certezas afloram, as tristezas caem fora e a alegria reina. Sim, na mesa de um bar eu sou uma pessoa melhor do que fora dela.

terça-feira, novembro 01, 2011

Dia 10: Clássico preferido

Segundo os literatos, o que faz um clássico ser "clássico" é sua atemporalidade. São livros que não envelhecem, não ficam datados, muito menos ultrapassados. Não representam a "voz de uma geração", mas o eterno e imperecível berro da humanidade.



Assim sendo, o meu clássico dos clássicos é o Dom Quixote de la Mancha, do sensacional Cervantes. Porque todas as nossas dores e alegrias estão ali retratados de forma magistral. Toda a insensatez e recato, toda a necessidade de reconhecimento, as vaidadezinhas e as muitas vergonhas, nossa imensa capacidade de altruísmo e nossas sórdidas mesquinharias. O medo de tudo, a covardia por nada. O anseio pela beleza, pela perfeição, pelo sublime. A ambição pelo elevado. Tudo o que nos faz humanos e o que desumaniza. A ira fácil, a melancolia suave, a felicidade desmedida. As muitas misérias e infinitos afetos. As surras que humilham o fidalgo e seu perdão incondicional. A ganância que move Sancho e a piedade que não deixa de sentir.





Não é, nunca foi, uma comédia, embora seja uma paródia e tenha seus momentos hilariantes. Não é, não deveria ter se tornado, uma história para crianças. Somos nós que estamos ali, do mais remoto antepassado ao mais distante descendente.


A linguagem, quase medieva, nos parece hoje empolada. É possível ler em espanhol, mas a leitura torna-se então mais trabalhosa e menos aprazível. Prefiro uma boa tradução.



"Conta Cid Hamete Benengeli, autor arábigo e manchego desta gravíssima, altissonante, mínima, suave e imaginada história, que, depois daquelas razões que houve entre o famoso D. Quixote de la Mancha e Sancho Pança seu escudeiro (de que no precedente capítulo XXI se deu conta) alçou D. Quixote os olhos, e viu que pelo seu caminho vinham uns doze homens a pé, engranzados como contas numa grande cadeia de ferro pelos pescoços, e todos algemados. Vinham igualmente com eles dois homens a cavalo, e outros dois a pé; os cavaleiros com escopeta de roda, e os peões com dardos e espadas. Assim que Sancho Pança, os viu, disse:


— Esta é cadeia de galeotes, gente forçada da parte de El-Rei, para ir servir nas galés.

— Como “gente forçada”? — perguntou D. Quixote — é possível que El-Rei force a nenhuma gente?

— Não digo isso — respondeu Sancho — digo que é gente que, por delitos que fez, vai condenada a servir o Rei nas galés por força.

— Em conclusão — replicou D. Quixote — como quer que seja, esta gente, ainda que os levam, vai à força, e não por sua vontade.

— É verdade — disse Sancho.

— Pois sendo assim — disse o amo — aqui está onde acerta à própria o cumprimento do meu ofício; desfazer violências, e dar socorro e auxílio a miseráveis.

— Advirta Vossa Mercê — disse Sancho — que a justiça, que é El-Rei em pessoa, não faz violência nem agravo a gente semelhante, senão que os castiga dos seus delitos.


Nisto chegou a cadeia dos galeotes, e D. Quixote com mui corteses falas pediu aos que os iam guardando fossem servidos de informá-lo, e dizer-lhe a causa, ou causas, por que levavam aquela gente daquele modo.

Um dos guardas de cavalo respondeu que eram galeotes (gente pertencente a Sua Majestade) que iam para as galés; e que não havia que dizer, nem ele que perguntar.

— Apesar disso — replicou D. Quixote — queria saber de cada um deles em particular a causa da sua desgraça.

A estes ditos ajuntou mais outros tais e tão descomedidos para resolvê-los a declararem-lhe o que desejava, que o outro guarda montado lhe disse:

— Ainda que levamos aqui o registro e a fé das sentenças de cada um destes desgraçados, não temos tempo que perder a apresentar papéis e fazer leituras. Chegue Vossa Mercê a eles, e interrogue-os se quer; que eles, se for sua vontade, lho dirão; pois é gente que põe gosto em fazer e assoalhar velhacarias.

Com esta licença, que D. Quixote por si tomaria, ainda que lha não dessem, chegou-se à leva, e perguntou ao primeiro por que mau pecado ia ali daquela maneira tão desastrada. Respondeu ele que por enamorado.

— Só por isso e mais nada? — replicou D. Quixote — Se por coisas de namoro se vai para as galés, há muito tempo que eu as pudera andar remando."

1 Comments:

Blogger Rubão said...

Amore, eu poderia dizer o mesmo a respeito de Watchmen. Eis aí nossa diferença: como um raio, tu penetras na esfera da mais alta literatura; já eu saio pela tangente desses círculos, restringindo-me mais à quadratura daqueles comic books.

Bj,
r

11/01/2011 10:47 AM  

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